Quando me deparei com a notícia de que novos livros didáticos aprovados pelo MEC e pagos com dinheiro do contribuinte eram claramente alinhados com o petismo no poder eu não me surpreendi. Livro didático aprovado pelo MEC é prêmio literário para intelectual orgânico, ora essa. Quem conhece o petismo sabe que ele não perde chance de fazer proselitismo. A mesma destapada malandragem se derrama pelos concursos públicos, pelas provas do ENEM e onde quer que surja uma brecha para a semeadura ideológica. Sabe aquele inço que nasce e se infiltra até numa trinca do piso? Pois é.
Não há cargo em disputa, nomeação possível, cadeira ou cátedra vazia, título honorário, medalha, redação de jornalismo, microfone livre, espaço cultural, passeata ou procissão onde o PT não se apresente. O PT não deixa livre nem cadeira de engraxate. Faça o teste. Quando estiver frente a um auditório lotado diga assim: "Quem quer ser...". Não precisará terminar a frase. Todos os que levantarem a mão são petistas. Estão sempre prontos para ser. Seja lá o que for. Quando conseguem ser, criam um aparelho e ficam sendo. Vá ao estádio do Beira-Rio em Porto Alegre. No meio da torcida colorada, faça chuva ou faça sol, frio ou calor, haverá uma enorme faixa com a estampa do Che Guevara - aquele vampiro argentino que se dizia com sede de sangue. O que faz ali a faixa? Por que se dão ao trabalho de carregá-la e desfraldá-la num campo de futebol, ano após ano? Proselitismo.
Nada escapa do aparelhamento. Estão nas Igrejas, nos sindicatos, nas universidades, nas escolas, nos cursos de preparação para o vestibular, nos cursos organizados para ingresso nas carreiras jurídicas (notadamente naqueles criados pelos órgãos de classe da magistratura e do ministério público), estão nas carreiras de Estado, nos conselhos profissionais, nas Forças Armadas, nos seminários, nos grandes jornais e nos boletins paroquiais, nos folhetos das missas e - claro, por que não? - nos livros didáticos do MEC petista. Então, essas coisas não me surpreendem. Plantou colheu. Elegeu o PT, vai ter isso aí. Tudo aparelhado. Tudo a serviço da causa.
O que me surpreendeu foi o retorno a uma fase anterior ao petismo no poder. Aquela segundo a qual o bom é ruim e o péssimo é ótimo. Lembrei-me daquele período e de que já havia escrito algo a respeito. Fui atrás e encontrei o texto. Ele foi publicado em 8 de dezembro de 1997 no Correio do Povo, numa época em que o petismo, chegando ao poder, começava a usar gravata. Lá pelas tantas, eu escrevi assim, referindo-me ao que se observara no esquerdismo dos anos anteriores:
"Chegou a ser moda não pentear os cabelos, tomar o menor número possível de banhos, andar mal vestido, falar com incorreção, tratar-se com curandeiros. Quem adotasse conduta oposta e ainda por cima lesse artigos de jornal e bons livros, acabava malvisto pelos companheiros. Havia políticos que eram incorrigíveis nos seus erros gramaticais cuidadosamente cultivados porque lhes proporcionavam singular identificação com as bases. Conheci alguns cujas esposas eram sempre apresentadas como companheiras porque tal palavra expressava uma relação mais popular e portanto mais adequada do que a outra. Ter uma boa formação acadêmica atrapalhava mais do que ajudava quando o assunto envolvia imagem e popularidade. Conheci pessoas que quando precisavam ir a uma vila trocavam de carro, de roupa e de sapato."
O tal livro do MEC que valoriza os erros de linguagem sinaliza, na esteira do lulismo, um retorno àqueles velhos tempos. Falar bem é ruim. Falar mal é bom. Nivele-se tudo por baixo! Na atividade rural, ser produtivo é ruim; ser improdutivo é bom. Os ministros petistas do STF que acusaram a família tradicional de ser uma família voltada para o patrimônio, ao passo que a família gay seria voltada para o amor andaram na mesma direção: família tradicional é ruim; família gay é bom. Na mesma linha, Venezuela é bom; Chile é ruim. Cuba é bom; Estados Unidos é ruim.
Também na linguagem, o petismo quer endeusar Lula. O "cara" sacralizou a linguagem inculta, certo? Logo, precisamos fazer com que as escolas não corrijam quem fala como o chefe, até porque há quem se disponha a pagar R$ 200 mil (!) pelo privilégio de vê-lo atropelar o idioma... Por fim, a produção verbal de Lula, consolidador da derradeira flor do Lácio, ainda mais inculta, mas sempre bela, o habilita ao fardão da Academia Brasileira de Letras. Alô, alô, Machado de Assis, os companheiros estão querendo Lula lá!
http://horaciocb.blogspot.com/2011/05/derradeira-flor-do-lacio-percival.html
Meu Comentário: 'ULTIMA FLOR DO LÁCIO'
Este é o lindo soneto de Olavo Bilac, no qual o poeta , alem de se referir à origem latina do nosso idioma, descobre nele uma estrutura antitética de rudeza e beleza; de força, vigor, ternura e doçura saudosas.
"Inculta e bela", disse Bilac sobre a língua portuguesa que deu alma a Camões para ecrever o clássico "Os Lusíadas" a quem todo estudante de língua portuguesa tem obrigação de ser apresentado.
Por que Lácio? Lácio era uma região da Itália antiga onde se falava o latim. Dessa árvore muitas flores brotaram (o francês, o espanhol, etc)e a última, a mais brejeira, foi a língua que falamos e escrevemos. Como filha mais nova, ela herdou muito dos caminhos e experiências de suas irmãs mais velhas. Daí o seu lastro de riqueza, de amplitude, comunicabilidade e liberdade de se recriar.
Quando os navios a trouxeram para essa colônia tropical, ela não levou muito tempo para conversar e absorver os ganhos das línguas originais do Brasil, faladas pelas culturas tupi-guarani. Depois, mais nos enriquecemos com o que nos trouxeram os nossos irmãos africanos.
Agora, passados alguns séculos, já não podemos chamá-la de inculta. Talvez, a humildade de Camões o tenha levado a assim caracterizá-la porque a grandeza dos Lusíadas prova o contrário. E aqui no Brasil, os nossos Guimarães Rosas, Drummond, Machado de Assis, Chico Buarque, Cartola e tantos outros, não nos permitem essa falsa modéstia.
Mas bela, flor de muitas pétalas e muitas cores, sim.
E é essa a língua que estrutura as nossas idéias, articula o nosso pensamento. Quem pensa sem as palavras, sem o nome das coisas, seus atributos, e a identificação dos sentimentos? Quem sonha sem descrever as suas fantasias com os recursos do seu idioma de cultura, de raiz?
Apropriar-se sempre mais, cultivar e até cultuar essa riqueza de origem é também, ampliar-se, alargar as possibilidades de se dizer, de se saber; e portanto, de desvendar condições de aproximar-se dos outros e melhor entendê-los.
O triste é que nem todos conseguem transformar esse potencial em registro. Ainda somos, nesse sentido, lamentavelmente, um povo de maioria analfabeta. A escrita é a extensão, a visibilidade da fala, como o gesto. É a oportunidade de mais amplamente socializar as nossas idéias e artes. Todos, sem exceção, teriam que poder contribuir e usar desse tesouro. Por que não podem?
'ULTIMA FLOR DO LÁCIO'
"Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura;
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
-
Amo-te assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela
E o arrolo da saudade e da ternura!
-
Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
-
Em que da voz materna ouvi: "Meu filho!"
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!"
(Olavo Bilac)

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