3 de março de 2011

'Acertando o passo.' (APARENTEMENTE)

MARCUS ALCOFORADO *


Depois de tantos tropeços que deixaram o Brasil em  posição vexatória no cenário internacional, finalmente o governo começa a acertar o passo em uma questão relevante para as nações democráticas e civilizadas: o respeito aos direitos humanos. Ontem o Brasil votou favoravelmente à suspensão da Líbia do Conselho dos Direitos Humanos da ONU e, felizmente, não acompanhou a Venezuela de Hugo Chávez, único país a fazer a defesa do regime tirânico de Kadafi.


É uma inflexão em relação à política externa de Lula, quando o então chanceler Celso Amorim dizia-se contrário a aplicação de sanções internacionais a regimes que violavam os direitos humanos por considerar como mais eficaz a conversa ao pé de ouvido com ditadores, “olho no olho”. Foi isto que levou o governo brasileiro a se abster em votações importantes da ONU, na condenação a violações cometidas por regimes como as ditaduras do Irã e do Sudão.


A decisão tomada pela ONU contou com a adesão de 192 países e representa claramente uma sanção contra as violações aos direitos humanos cometidos por Kadafi, como o genocídio praticado  contra seu próprio povo. É confortável saber que o Brasil está entre estes 192 países, embora isto devesse ser a coisa mais normal da nossa política externa. O absurdo vem de antes, quando Lula saiu pelos quatro cantos do mundo para posar ao lado de ditadores e trata-los com deferências incompatíveis com as tradições de nossa diplomacia. Nunca é demais relembrar que nosso caudilho se referia a Kadafi como um grande amigo. 


A inflexão da política externa nos coloca em sintonia com o concerto das nações, no que diz respeito à observância dos direitos humanos. Tal mudança, associada a uma postura menos antiamericana, pode retirar o Brasil do isolamento ao qual Lula nos levou. Sintomaticamente, durante seu governo nosso país foi derrotado em todas as disputas em que pleiteou a direção de organismos internacionais. 


Agora, há indícios que as coisas estão mudando. Depois de um longo e tenebroso inverno, os Estados Unidos podem endossar um nome brasileiro para um posto de visibilidade na ONU, pois há chances concretas de o governo norteamericano apoiar a indicação de José Graziano para a direção da FAO - Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação. 


Isto  ainda não é líquido e certo, até porque se houver  recaída no antiamericanismo infantil, o apoio  dos EUA cairá por terra. É bom, portanto, o assessor especial da presidência, Marco Aurélio Garcia, continuar de boca calada e ficar no fundo do palco, para não estragar tudo. Convém, portanto, a presidente fortalecer o chanceler Antônio Patriota, que tem adotado uma postura mais profissional nas relações externas.


As mudanças ainda são incipientes e necessitam ser consolidadas, para que voltemos ao tempo em que nossa política externa pautava-se pelos valores universais, como a defesa da democracia, dos direitos humanos e da autodeterminação dos povos. Assim foi no governo de Fernando Henrique. Esperamos que o governo Dilma marche nesta direção e sem recuos.


Por enquanto o que temos são nuances em relação à política externa do governo anterior. Mas elas já vêm despertando a ira de Lula, que fica arrepiado toda vez que houve o nome do novo chanceler e diz impropérios do tipo “de Patriota, ele não tem nada”. Entende-se o  nervosismo. Uma nova postura do governo brasileiro em relação aos direitos humanos cola na testa de Lula o selo de “amigo de ditadores”.


Segundo a imprensa, Lula já fez chegar aos ouvidos de Dilma a sua insatisfação com as mudanças  na política externa, pois elas evidenciam que ele errou feio ao ter abraçado ditadores iranianos, líbios e egípcios, que agora estão sendo varridos do mapa por seus povos. Ainda segundo a imprensa, nosso caudilho estaria extremamente irritado com a postura menos hostil de Dilma, em relação ao governo norteamericano.


Nos últimos oito anos, a política externa foi uma área privativa da esquerda petista, a quem o governo Lula quis fazer um agrado. É previsível que esta esquerda, ao sentir que não está mais dando as cartas, se articule para inviabilizar as mudanças da política externa, que, se levadas até o fim, nos colocará em sintonia com o que há de melhor na tradição do Itamaraty e com o concerto das nações democráticas.


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