3 de agosto de 2010

Equívocos na defesa de altos impostos (Editorial)

DEU EM O GLOBO
Político traquejado, de longa quilometragem sobre carros de som em portas de fábrica e na condução de assembléias sindicais, o presidente Lula não consegue o mesmo bom desempenho quando envereda por temas técnicos.
Na sexta-feira, perante empresários reunidos na Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), o presidente fez temerária defesa da carga tributária elevada.
Esta postura se baseia numa visão política e ideológica de Lula e seu governo de que o Brasil necessita de um “Estado forte”, eficiente coletor de altos gravames para poder fazer “justiça social”. Sua candidata, Dilma Rousseff, já demonstrou em entrevista achar o mesmo.
O presidente erra no conceito, pois são estes altos impostos — 36% do PIB, mais do que em qualquer outro país emergente — que geram várias distorções. Entre elas, uma grande informalidade, nos negócios e no mercado de trabalho, além de desincentivo aos investimentos produtivos.
Lula, no discurso, lembrou países com carga de impostos de 40%, 50% do PIB, nos quais existe um estado de bem-estar social, “onde todos são fortes, bonitos e corados”.
A discussão a se travar, entende Lula, é sobre se o dinheiro do contribuinte é bem aplicado, independentemente do peso dos impostos.
A referência de Lula é a Europa. Lá, porém, o tal estado do bem-estar ("welfare state"), já em crise em alguns países diante da agressiva concorrência da China e vizinhos, mergulhou ainda mais em problemas com a insolvência da Grécia e o risco de Espanha, Portugal, Itália e outros irem pelo mesmo caminho.
Cercadas por vertiginosos déficits fiscais, sociedades europeias têm sido obrigadas a rever generosidades na previdência e em outros gastos ditos sociais.
O Brasil, por sua vez, não sai bem na foto quando se discute o destino do dinheiro dos impostos.
Estabilizada a economia, com o Plano Real, a partir de 1994, os governos FH e Lula alcançaram o equilíbrio fiscal às custas do contribuinte: neste período, a carga tributária cresceu cerca de dez pontos percentuais do PIB, os gastos públicos também só fizeram aumentar, e em velocidade maior.
Na realidade, o estado brasileiro virou um gigantesco pagador de salários, benefícios previdenciários e bolsas assistenciais.
Em 1987, um ano antes da promulgação da Constituição da redemocratização, 39% das despesas não financeiras da União tinham este destino. No ano passado, foram 75%.
Entende-se por que os tão necessários investimentos em infraestrutura minguaram.
Pode-se argumentar que este era e é o sentido da Carta de 1988. Mas também se deve perguntar se este é o melhor caminho para o país, considerando que faltam dinheiro e gerência eficiente para crianças e jovens serem educados num padrão de qualidade mínimo — sem falar na saúde pública.
Do ponto de vista do peso da carga de tributos e do que é feito com essa montanha de dinheiro — questão proposta pelo presidente —, o brasileiro vive a pior das situações: paga muitos impostos, não recebe em troca serviços de qualidade do Estado — ao contrário do que acontece na Europa — e ainda tem o futuro de filhos e netos comprometido, se não tiver recursos para adquirir o que o Estado não lhe fornece: educação e saúde.
Mais impostos apenas engorda um Estado sem condições de reverter o que arrecada em melhores serviços e em meios para que a sociedade se desenvolva.

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